“Um Jesuíta e um Franciscano estão a caminhar num jardim, silenciosamente ocupados nas suas orações, quando o Jesuíta puxa um grande charuto e o acende. O Franciscano sussurra: ‘O meu orientador espiritual diz que não devemos fumar enquanto oramos’. O Jesuíta responde: ‘O meu disse que não faz mal, desde que eu reze enquanto fumo’.”
A Mecânica de Deus Como os Cientistas e os Engenheiros Entendem a Religião; Guy Consolmagno.
Estava eu pegando um sol enquanto lia um livro sobre a vida de São Francisco de Assis; ou lendo enquanto pegava um sol? Bem, não sei. Só sei que partilho o amor ao senhor irmão Sol com o Francesco. Mas, pareceu-me, os animais não têm o mesmo amor por mim como pelo francesinho.
Pois nesse agradabilíssimo momento, um zangão, o macho das abelhas, brotou e ousou voar quase ao pé do meu ouvido. Senti de imediato um arrepio na espinha enquanto seu zum-zum-zum ressoava em minha alma. Senti um medo maior do que sentiria por surpreender uma aranha investigando meu ombro. Mas por quê? Já que o zangão sequer tem ferrão, e eu racionalmente sei disso há bom tempo.
Porque na minha infância toda me diziam que a picada do zangão era fatal. Sim, morte na certa, principalmente em crianças. Falecimento ao mesmo tempo imediato e demoradamente doloroso. Lembro que chegara à conclusão: "então é por isso que o chamam de Zangão! Zangão, o zangado, o assassino irado!" Que bicho danado, voando por aí querendo matar criancinhas...
Já corri muitas vezes de zangões em minha infância. Corria como se costumava fugir de leprosos. Sentia que seu zunido era presságio de morte. Lançava-me em máxima velocidade, enquanto com as mãos abanava as orelhas… Mas a verdade é que além de ser manso, seu nome não vem de sua suposta ira; e sim de seu zumbido.
Não só isso. O zangão não tem pai, pois nasce de ovos não fecundados. Ele não possui ferrão nem formas de obter o próprio alimento; depende de ser alimentado pelas abelhas operárias. Só tem uma função: fecundar as abelhas-rainhas. Após exercerem esta sua incumbência única (a mais essencial de todas...), os zangões são expulsos das colmeias; ou até antes quando há falta de alimentos.
Em muitos casos ele se sacrifica no ato, pois parte de seu corpo qual fica preso na rainha, causando uma morte lenta e sofrida. Na verdade, a imensa maioria dos zangões vive seus dias numa eterna e incansável procura. Sim, quase todos morrem virgens, solitários, repudiados. Mas a despeito de jejum e exílio, mantêm seu vigoroso canto e sua busca insaciável.
Isso significa que ao vermos um zangão zanzando, ou ele está à procura de um lar momentâneo, para gerar o milagre da vida e em seguida ser expulso; ou acaba de ser expulso por estar comendo demais. Ele está voando por aí sempre sem ter alimento nem casa, e nem mesmo meios de defesa. É um ser de entrega total. Vive para gerar vida, sem meios próprios de subsistência. E pouco lhe importa que será renegado instantes após garantir o sustento de toda a colmeia.
Quanta injustiças sofrem os abelhões! Quantas injustiças eu cometi com os dóceis zangões! Quem sabe eu sinta, digamos instintivamente, compaixão — e não repulsa — da próxima vez que ouvir aquele caracterísco zum-zum-zum bem-disposto.